Livro Povo de Deus é um “manual” para a esquerda conquistar voto evangélico?

Por causa do sucesso e das menções de Lula ao livro, têm me perguntando se o Povo de Deus é um manual para a esquerda e se trabalharei em campanha política

juliano spyer
3 min readOct 25, 2021
Nota sobre a minha participação da Bienal do Rio publicada no blog do Lauro Jardim no site dO Globo em 23 de outubro.

Os bons antropólogos nos ensinam a atentar para regularidades como indicadores da relevância de um assunto. Só na última semana dois jornalistas me perguntaram se meu livro é um manual para a esquerda conquistar o voto evangélico e se eu vou trabalhar em alguma campanha política, tendo em vista que 2022 haverá eleições para presidente e governos.

São perguntas justas de se fazer considerando a exposição que o livro recebeu por meio de alguns políticos de esquerda, particularmente do ex-presidente Lula, que compartilhou uma foto junto com o deputado Marcelo Freixo, segurando uma cópia do meu livro.

Escrevi o livro tendo como leitores imaginários as pessoas que se identificam com esses candidatos. Mas — quem leu o livro, sabe — em vez de manual utilitário, Povo de Deus é uma provocação a essas pessoas.

Nas primeiras páginas critico a postura do então candidato presidencial Fernando Haddad por chamar o bispo Edir Macedo de “charlatão”, criando a oportunidade para os evangélicos bolsonaristas constrangerem aqueles que, em suas igrejas, desencorajavam o apoio ao ex-capitão. E na parte do livro dedicada a política, argumento que a campanha de Freixo abraçou evangélicos progressistas, minoritários, e manteve-se distante do evangélico pobre e conservador de igrejas como a Assembleia de Deus, onde 1/3 dos membros vive com até meio salário mínimo.

Povo de Deus é o resultado de uma pesquisa de campo de 18 meses em um bairro pobre na Bahia e de um esforço para reunir e disseminar o resultado das pesquisas de cientistas sociais sobre o fenômeno do cristianismo evangélico no Brasil.

O ponto forte do livro é essa combinação de experiência vivida e fundamentação científica, mais o esforço para escrever sobre isso de maneira clara e objetiva. Ele convida leitores que defendem valores progressistas a perceber, para além das visões estereotipadas sobre evangélicos, que a razão para o crescimento do cristianismo evangélico no Brasil é que ele melhora a vida do brasileiro pobre. E que, nesse sentido, esse fenômeno contribui com a redução da desigualdade no país, promovendo o auto-respeito, empreendedorismo e disciplina pessoal e no trabalho.

Portanto, não, Povo de Deus não é um manual para ensinar como tirar proveito do eleitor evangélico. É uma introdução sociológica a esse tema.

E em relação a trabalhar para campanhas políticas: não fui procurado nem estou procurando.

Mas sim, estarei na Bienal do Rio no dia 12 de dezembro, para participar da mesa de discussão “Invisíveis?”, junto com a vereadora de São Paulo Erika Hilton e o jornalista Rene Siva, fundador do Voz das Comunidades. A ideia é debater gênero, religião e negritude a partir da perspectiva de quem têm ajudado a dar voz à população LGBTQIA +, negra, periférica e evangélica. E como o evento será híbrido, presencial e online, qualquer pessoa ligada à internet poderá acompanhar.

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