O que hoje quer dizer "direita" e "esquerda"

juliano spyer
4 min readFeb 15, 2020

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Tenho sentido impaciência para usar os termos “direita” e “esquerda”. Me sinto histórica e familiarmente sendo “de esquerda”, mas nos últimos anos, por conta desta classificação sou, por um lado, obrigado a defender acriticamente os legados dos governos petistas, ou insultado por ter votado no Haddad contra um ex-capitão e apoiador da Ditadura.

Existem pelo menos dois motivos que contribuem para produzir essa confusão de significado sobre ser de esquerda ou de direita.

  1. o clima da polarização dentro do qual “esqueda” e “direita” se tornaram fardas de exércitos inimigos. E nas guerras, a dúvida, a incerteza, o próprio pensamento e a ponderação frequentemente se tornam crimes.
  2. Apesar da polarização, eexiste um campo "sujo" por contradições. Como fica o eleitor do Alckmin que votou no Haddad? Ou o ex-eleitor do PT, nordestino, trabalhador, que escolheu o Bolsonaro pela promessa de combate à corrupção que envolveu os governos petistas?

A seguir falo rapidamente sobre as decisões metodológicas para que esta pesquisa informal não seja vista como uma maneira de disfarçar a minha opinião usando as opiniões de pessoas próximas. Toda pesquisa é enviezada — da mesma forma como, se diz entre historiadores, que não existe fato neutro. Mas se o leitor apressado quiser saltar o blablabla esperado no campo acadêmcio, pode saltar para os resultados no final do documento.

Uma pesquisa informal

O que apresentp a seguir não é um ensaio opinativo, mas o resultado de uma pesquisa informal realizada por em campo por meio de uma ferramenta de comunicaçao pessoal, o WhatsApp, tendo como amostra em torno de 50 pessoas que se identificam com posições diversas neste contexto. Eles e elas são principalmente pessoas com títulos universitários com mais de 40 anos.

Para cada uma perguntei: — Qual palavra (uma palavra) você associa com “direita” e qual com “esquerda”?

Tabulei as respostas e apresento o resultado a seguir. Percebi, entre as muitas respostas, quatro “padrões” que usei como referência para classificação e ordenação. Minha pretenção é mais apontar para as partes confusas e imprecisas no que se refere ao uso dos termos “direita” e “esquerda” do que oferecer respostas e conclusões. Já peço desculpas por não ler e reler o texto final; farei isso com a ajuda dos comentários (seu eu tiver sorte) educados que eventualmente aparecerem no fim deste documento.

Tabulação

  1. Positivo e negativo — o participante entende que um dos termos é bom e que o outro, oposto a ele, é ruim
  2. Neutro — o participante geralmente escolhe palavras que individualmente expões aspectos positivos ou descritivos em relação a direita e a esquerda. Por exemplo, direita é “descentralização” e esquerda é “centralização”
  3. Um número menor de participantes saiu pela tangente geralmente dando respostas cômicas que sugerem um desinteresse / cansaço / frustração em/por falar sobre esse assunto.
  4. Houve um pequeno número de respondentes que classificou as duas palavras apenas como “bom” ou “nós” em relação a “ruim” e “eles”

Para possibilitar algum tipo de análise feita muito rapidamente — com poucos respondentes, apenas uma pesquisa, apenas três horas para processar e analisar os resultados — tomei duas decisões:

  1. Reuni as respostas classificadas como “positivas” e “neutras” por causa das interseções recorrentes entre esses dois grupos. As respostas “negativas”, apresentadas também, trouxeram menos valor por são o oposto do que aparece nos agrupamentos de positivas/neutras.
  2. Não considerei as respostas cômicas, nao por considerá-las inúteis, mas porque tornaria este exercício mais cansativo e longo, sendo que os contrastes apresentados já cumprem o objetivo desta pesquisa informal.

RESULTADOS: palavras livremente associadas aos termos “direita” e “esquerda”.

VALORES
- Direita e conservadorismo: o principal identificador associado a ser de direita é o conservadorismo de costumes. Sete participantes fizeram essa associação
- Esquerda progressista: Apenas duas pessoas relacionaram ser de esquerda a progressista. Mas aparecem termos semelhantes como “avanço”, “direitos”, “liberdade” e questionar.

ECONOMIA
- Direita e mercado: muitas das classificações positivas ou neutras para definir direita fazem referência a mercado, capitalismo, liberalismo, economia, desregulamentação e privatização.
- Esquerda e economia: os termos relacionados, entre positivos e neutros, são: socialismo, centralizado, regulação e estatização.

INDIVIDUALISMO
- Direita e mérito: este bloco se relaciona a economia, mas se baseia em um juízo de que direita significa ser batalhador, esforçado, dinâmico.
- Esquerda e humanismo: ser de esquerda significa ser a favor do social (mencionado cinco vezes), no sentido que combater a desigualdade social. Por isso, ser de esquerda é associado a “compaixão”, a “direitos”, a “justiça”, a “solidariedade”, a valorizar as pessoas em relação à produção de riquezas, a ser a favor do pobre, a querer cuidar do bem comum.

OUTROS TERMOS
- Direita também foi associada, de forma positiva ou neutra, a sensatez, gradidão, ordem, Bolsonaro, azul, reagindo e pernas.
- Esquerda, nesta semelhante gaveta de sobras, é relacionada a avanço, esperança esquizofrênica, Lula, vermelho, desorganizada e braços

O RUIM
Os aspectos ruins mencionados na pesquisa associados a direita e esquerda são o oposto daquilo que se apresenta como positivo de cada categoria.

- Direita é vista como: retrocesso, egoísta, exploração, privilégios, cabeça-fechada, exclusão, militar, gula, insensível, empresários, aristocracia e ressentimento.

- Esquerda, da perspectiva oposta, é quem apoia a vagabundagem, é aproveitador, tem preguiça, é pretensioso, é intervencionista e egoísta.

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Written by juliano spyer

ethnographer, digital media enthusiast and writer. Mais em: www.julianospyer.com

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