O rato do laboratório, a heroína e o Facebook
O autor britânico Johann Hari escreveu um livro sobre a história da “guerra contra as drogas”, que é a estratégia institucional de combate ao consumo e ao tráfico pela repressão violenta.
Ele cita muitos trabalhos de cientistas. O principal é de um psicólogo canadense que refez aquele experimento clássico que “prova” que drogas causam dependência. Originalmente, coloca-se um rato em uma gaiola e oferece-se heroína diluída. Em semanas o rato demonstra comportamento de quem se tornou dependente da substância. Mas o canadense fez algo diferente.
Na sala ao lado desse gaiola, ele pôs outra gaiola, em que o rato estava acompanhado de outros ratos (e ratas) para brincar e namorar. Tinha tipos diferentes de comidas e brinquedos. E o bebedouro com a heroína. Resultado: radical desinteresse pelo consumo da droga.
Ou seja, não é a disponibilidade da droga que faz a pessoa se drogar, mas o estado de quem é exposto a ela. O rato da primeira gaiola não ficou dependente pela droga estar disponível, mas pela solidão de estar em uma gaiola em um laboratório sem nada o que fazer.
A conclusão, que Hari apresenta neste TED Talk (em inglês), é que o contrário de dependência não é sobriedade, mas uma capacidade de entrar em contato e estabelecer vínculos com outras pessoas. Quem não consegue fazer isso naturalmente pode recorrer à droga para conseguir se relacionar.
Lembrei desse experimento porque ontem eu passei o dia com amigos. Como no caso do ratinho da gaiola feliz, havia comidas variadas, música tocando e sobretudo pessoas queridas indo e vindo. Foram varias horas assim, curtindo. E me dei conta agora: não dei bola para Facebook ou nada do gênero nessas horas.
Esse é um mote conhecido: “a internet afasta as pessoas”, que por sua vez é uma variação da ideia de que na sociedade ocidental os vínculos de solidariedade estão sendo dissolvidos. Mas para além de ideias e conceitos me vejo, nos momentos de vazio interior/exterior, estendendo a mão para o aparelho, o corpo gritando por aquele afago frio do aparelho, e vejo aquele rato em sua gaiola de laboratório. Cada qual em sua prisão.